- camilarodycz
- 4 de fev. de 2021
- 1 min de leitura
"As coisas que não têm nome são mais pronunciadas por crianças."
Manoel de Barros
"As coisas que não têm nome são mais pronunciadas por crianças."
Manoel de Barros




O apanhador de desperdícios
Manoel de Barros

Uso a palavra para compor meus silêncios.
Não gosto das palavras
fatigadas de informar.
Dou mais respeito
às que vivem de barriga no chão
tipo água pedra sapo.
Entendo bem o sotaque das águas.
Dou respeito às coisas desimportantes
e aos seres desimportantes.
Prezo insetos mais que aviões.
Prezo a velocidade
das tartarugas mais que a dos mísseis.
Tenho em mim um atraso de nascença.
Eu fui aparelhado
para gostar de passarinhos.
Tenho abundância de ser feliz por isso.
Meu quintal é maior do que o mundo.
Sou um apanhador de desperdícios:
Amo os restos
como as boas moscas.
Queria que a minha voz tivesse um formato de canto.
Porque eu não sou da informática:
eu sou da invencionática.
Só uso a palavra para compor meus silêncios.
Como é a sua relação com a natureza?
No início desta semana, abri nos meus Stories uma caixa com essa pergunta. Fiquei muito feliz com a generosidade de quem participou dessa conversa e encantada com as respostas.
Uma necessidade diária, um chamado ancestral, um retorno ao que nos é essencial, uma experiência de paz... Há tantas formas de viver e expressar essa relação. Impossível descrever de forma única ou definitiva um relacionamento em que experimentamos o belo, o perfeito, o divino e, simultaneamente, o mistério, o brutal, o incontrolável.
Quando penso na minha relação com a natureza, lembro-me do genial Manoel de Barros. “Meu quintal é maior que o mundo”, disse o poeta, revelando que a partir do microcosmo do seu quintal, povoado de sapos e insetos, ritmado pelo fluir das águas e cantar dos pássaros, ele se relaciona com a vastidão de todo universo. Gosto de fazer esse exercício, encontrar a natureza no espaço da própria casa, inclusive no corpo, nossa morada mais íntima, igualmente povoada e ritmada pela natureza.
Também me agrada o movimento inverso: fazer do mundo meu quintal. Não é preciso ir longe, uma volta na quadra já é suficiente para testemunhar o apelo estridente do quero-quero, o perfume do jasmineiro em flor, até o cocô do cachorro do vizinho distraído – como em qualquer relação, nem tudo cheira bem o tempo todo. É assim com a natureza que há em mim, é assim com a natureza que há em toda parte.
E para você, como é?








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